PROTESTO EM CARTÓRIO RECUPERA R$ 77 BILHÕES EM DÍVIDAS PARA UNIÃO, ESTADOS E MUNICÍPIOS
Paula Brito - 14/11/2025
Em meio aos desafios fiscais enfrentados pelos entes públicos para aumentar a arrecadação, uma ferramenta extrajudicial e de baixo custo tem se destacado pela eficiência: o Protesto de dívidas em Cartório. De março de 2024 a abril de 2025, a União, os Estados e os municípios conseguiram recuperar mais de R$ 77 bilhões em dívidas públicas ativas por meio dos Cartórios de Protesto — um mecanismo gratuito para o ente público e com alta efetividade de arrecadação.
No período foram apresentados mais de 26,1 milhões de dívidas a protesto, um crescimento de 182% em relação a março de 2023 a fevereiro de 2024, que totalizou 9,26 milhões de títulos. A taxa média de recuperação de tributos alcançada foi de 25%, com destaque para as procuradorias municipais, que atingiram 27% de sucesso, seguidas pelas estaduais (24%) e federais (21%).
“Os números deixam claro que o Protesto não é apenas uma alternativa à judicialização: é uma estratégia moderna, eficaz e acessível para a recuperação de receitas públicas”, afirma André Gomes Netto, presidente do Instituto de Estudos de Protesto de Títulos do Brasil (IEPTB). “O modelo tradicional de execução fiscal está sobrecarregado, enquanto os Cartórios oferecem uma via rápida, segura e com resultados concretos, sem custo algum para o Poder Público”, completa.
A comparação com os indicadores da Justiça brasileira reforça o contraste. De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), as execuções fiscais representam cerca de 39% de todos os processos pendentes no país, com uma taxa de congestionamento superior a 90%, sendo que apenas 8 em cada 100 ações são baixadas. Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) mostram que apenas um terço das execuções resulta em quitação integral — percentual que cai para 25,8% quando não há citação pessoal —, enquanto o custo estimado de cada execução na esfera federal gira em torno de R$ 4.368,00 com tempo médio de tramitação que supera os seis anos.
Para o presidente do IEPTB, a crescente adesão dos entes públicos ao Protesto é um indicativo de maturidade institucional. “A cobrança judicial, especialmente para valores de pequeno e médio porte, tornou-se antieconômica e ineficiente. O Protesto se apresenta como uma política pública de arrecadação inteligente, que devolve bilhões aos cofres públicos e desafoga o Judiciário, sem abrir mão da segurança jurídica”, afirma André Gomes Netto.
UNIÃO
Somente a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e a Procuradoria-Geral Federal (PGF) foram responsáveis por mais de R$ 66,7 bilhões do montante total recuperado, equivalente a 86,6% da arrecadação de dívidas públicas via protesto, utilizado principalmente para a cobrança de tributos como Imposto de Renda, Cofins, PIS, CSLL, além de débitos com autarquias e fundações, como INSS, Ibama e Anvisa.
“Na via judicial a recuperação efetiva não chega a 2%, enquanto no Protesto, historicamente, tem-se recuperado em média 20% das CDAs enviadas”, destaca a presidente do Instituto de Estudos de Protesto de Títulos do Brasil - Seção Distrito Federal (IEPTB-DF) e vice-presidente do IEPTB, Ionara Pacheco de Lacerda Gaioso.
A recuperação de CDAs através do Protesto também encontra respaldo no Supremo Tribunal Federal (STF), que, ao julgar o Tema 1184 da repercussão geral, decidiu que os entes públicos devem, sempre que possível, buscar meios extrajudiciais de cobrança antes de ajuizar execuções fiscais de pequeno valor, reconhecendo expressamente o Protesto de certidões de dívida ativa como um mecanismo legítimo e eficaz de prévia tentativa de recuperação do crédito.
“O ajuizamento da execução fiscal dependerá de prévia adoção de uma das seguintes providências: (a) tentativa de conciliação ou adoção de solução administrativa; (b) Protesto do título, salvo por motivo de eficiência administrativa, comprovando-se a inadequação da medida”, afirmou a tese fixada sobre o tema.
“A pesquisa empírica demonstrou que o Protesto é muito mais eficiente do que a instauração direta da execução. O que nós queremos é que o Protesto seja sempre feito, a menos que se demonstre porque ele não é conveniente naquele caso. Portanto, aí, é uma questão de eficiência importante, independentemente do valor. A execução fiscal é o maior gargalo da Justiça brasileira e essa decisão vai permitir que nós possamos avançar de maneira significativa na redução do estoque das execuções fiscais existentes no País”, discursou na ocasião o presidente do STF, Luís Roberto Barroso.
Pouco tempo depois, em fevereiro de 2024, foi publicada a Resolução 547 do Conselho Nacional de Justiça, que institui medidas de tratamento racional e eficiente na tramitação das execuções fiscais pendentes no Poder Judiciário, a partir do julgamento do tema 1184 da repercussão geral pelo STF.
Segundo a Resolução, “o Protesto de certidões de dívida ativa costuma ser mais eficaz que o ajuizamento de execuções fiscais, sendo que o ajuizamento da execução fiscal dependerá, ainda, de prévio Protesto do título, salvo por motivo de eficiência administrativa, comprovando-se a inadequação da medida.”
Na ocasião do julgamento do STF, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, através da procuradora Anelize Lenzi Ruas de Almeida, disse que “a exigência do crédito público envolve uma gama enorme de variáveis e eles sustentam o Estado brasileiro”.
“O Protesto é um ótimo instrumento, tem se mostrado uma ferramenta de recuperação de crédito que chega a patamares de sucesso de mais de 17% comparado a instituições privadas e a instituições financeiras”, destacou a procuradora da PGFN durante o julgamento.
ESTADOS
Em âmbito estadual, foram protestados mais de 7,7 milhões de títulos de dívidas, gerando o equivalente a R$ 8 bilhões devolvidos aos respectivos erários, principalmente de tributos como IPVA, ICMS, taxas estaduais, autos de infração e penalidades ambientais.
No nordeste do país, a Procuradoria-Geral do Estado do Maranhão (PGE/MA), através do procurador Angelus Maia, afirma que o Protesto extrajudicial reúne atributos que o qualificam como um dos instrumentos mais eficazes para a recuperação de créditos, com potencial de se consolidar como política pública estável e de longo prazo. Para fortalecer ainda mais sua institucionalização, torna-se essencial avançar no desenvolvimento e na modernização das plataformas tecnológicas que viabilizam a comunicação integrada com as centrais de Protesto.
“O Protesto gera efeitos imediatos para o devedor, como a redução do score de crédito e a restrição de acesso a operações de financiamento, empréstimos e compras a prazo. Esse impacto direto costuma levar o contribuinte a buscar rapidamente o pagamento ou o parcelamento do débito. Já a execução fiscal, via de regra, demanda um tempo maior para alcançar a constrição patrimonial — é necessário citar o devedor, localizá-lo, aguardar eventual apresentação de embargos — e, quando finalmente se busca efetivar a penhora, muitas vezes o devedor já se encontra insolvente ou sem bens aptos a garantir a execução, o que compromete a efetividade do processo judicial”, salienta o procurador.
Na região centro-oeste, a procuradora-geral do Estado de Mato Grosso do Sul (PGE/MS), Ana Carolina Ali Garcia, explica que o Protesto tem se mostrado um aliado estratégico na recuperação do crédito tributário, contribuindo para elevar os índices de retorno e encurtar o prazo de cobrança. Além de agilizar os processos, o mecanismo ajuda a diminuir as despesas da administração pública e a reduzir a sobrecarga gerada pelas execuções fiscais.
“Com o uso do Protesto e outros meios extrajudiciais, a advocacia pública estadual tem inovado e buscado instrumentos que conferem maior eficiência na arrecadação e, ao mesmo tempo, oportunizam conformidade fiscal ao contribuinte. Com isso, a idealizada melhoria do ambiente de negócios e o positivo impacto no desenvolvimento econômico dos entes federados”, pondera a procuradora.
No Distrito Federal, o gerente de Protesto de Títulos da Procuradoria-Geral do Distrito Federal, Afrânio Morais Cruz, diz que os índices de recuperação foram de 30,64% e 14,31% respectivamente. Embora o índice qualitativo possa parecer baixo, no período analisado, o valor recuperado/negociado ultrapassa a cifra de R$ 1 bilhão.
“Entre as vantagens da cobrança extrajudicial por meio do Protesto, em relação à execução fiscal, podemos citar o menor tempo de recuperação dos créditos inscritos em dívida ativa, o baixo custo da operação para a Administração Pública, além do efeito educativo que recai sobre o devedor, causado pelas restrições ao crédito”, ressalta Cruz.
No sudeste do país, a procuradora-geral do Estado de São Paulo, Inês Maria dos Santos Coimbra, revela que o Protesto representa um mecanismo essencial na cobrança da dívida ativa, destacando-se pela rapidez na tramitação e pela eficácia em estimular o contribuinte a regularizar seus débitos.
“O Protesto desempenha um importante papel na melhoria da arrecadação da dívida ativa, especialmente no contexto da negativação dos débitos inscritos, fortalecendo a capacidade da PGE de efetuar uma cobrança extrajudicial qualificada”, indica a procuradora.
No Rio de Janeiro, o procurador-chefe da Procuradoria da Dívida Ativa, Paolo Henrique Spilotros Costa, afirma que o Protesto atua como um fator de pressão sobre o devedor, já que a restrição de acesso ao crédito e a dificuldade em firmar novos negócios jurídicos funcionam como estímulos para a quitação da dívida.
“É uma ferramenta a mais que o Estado dispõe para cobrar seus créditos sobretudo os constituídos em face de pessoas físicas, embora a execução fiscal conserve a sua importância por ser o único meio atualmente previsto na legislação para a Fazenda atuar contra o patrimônio do devedor inscrito, realizando constrições patrimoniais”, comenta o procurador.
No sul brasileiro, no estado de Santa Catarina, o procurador-chefe da Procuradoria Fiscal (Profis) da PGE/SC, Ricardo de Araújo Gama, aponta que a cooperação firmada entre a Procuradoria e o Instituto de Estudos de Protesto de Títulos do Brasil – Seção Santa Catarina (IEPTB/SC) vem gerando resultados expressivos na recuperação da dívida ativa do Estado, abrangendo tanto créditos tributários quanto não tributários.
“A política de Protesto de títulos, em prática há mais de 10 anos por meio do Decreto Nº 2.429, de 21 de outubro de 2014, consolida- -se como uma alternativa eficiente prévia à cobrança judicial, uma vez que o tempo de retorno e a demanda de serviços para o Protesto são significativamente inferiores aos esforços em execuções fiscais”, diz o procurador.
No estado do Paraná, o Procurador do Estado da Coordenadoria de Assuntos Fiscais, Eduardo M. Lima Rodrigues de Castro, afirma que em 2025, o índice sofreu redução em razão do expressivo volume de mais de 150 mil Certidões de Dívida Ativa (CDAs) ajuizadas mensalmente pelo Estado. Já em 2024, os Protestos foram responsáveis por mais de 15% da arrecadação, considerando tanto os débitos levados a juízo quanto aqueles encaminhados ao Protesto.
“Com o Protesto, o Estado vem reduzindo significativamente a judicialização. Para se ter uma ideia, em 2025, foram protestadas 722.813 CDAs e ajuizadas apenas 56 execuções fiscais”, esclarece o procurador.
No Rio Grande do Sul, o subsecretário adjunto da Receita Estadual, Luis Fernando Crivelaro, indica que entre 2023 e 2025, os débitos encaminhados pelo Estado ao Protesto extrajudicial resultaram na recuperação de 52,5% do IPVA, 11% do ITCD e 9,62% do ICMS.
“O Protesto extrajudicial já está incorporado às ações rotineiras de cobrança da Receita Estadual, sendo considerado uma ferramenta permanente, e tem cumprido papel importante na liquidez do crédito tributário”, conclui o subsecretário.
MUNICÍPIOS
As procuradorias municipais apresentaram mais de 7,2 milhões de títulos a protesto, alcançando uma taxa média de recuperação de 27%, a mais alta entre todas as esferas. Esse desempenho resultou na restituição de aproximadamente R$ 2,7 bilhões aos cofres de municípios em todo o Brasil com a cobrança de dívidas como multas de trânsito, IPTU, ISS, taxas de lixo, multas administrativas e outros encargos de competência local.
Coordenador da Dívida Ativa do município de Salvador desde 2013, Anderson Souza Barroso explica que a Procuradoria passou a utilizar o Protesto extrajudicial em novembro de 2014. De lá para cá, a ferramenta garantiu, em média, 3,64% da arrecadação da Dívida Ativa, tomando por base o desempenho obtido ao longo da última década.
“O Protesto extrajudicial consolidou-se como um instrumento relevante e, muitas vezes, prévio ao ajuizamento da execução fiscal. A partir de 2024, com a promulgação da Lei Complementar nº 208/24, essa via ganhou ainda mais importância, uma vez que o Protesto passou a constituir causa de interrupção da prescrição, agregando segurança jurídica e efetividade à cobrança”, diz o coordenador.
Já o diretor de Arrecadação e Cobrança da Secretaria Municipal da Fazenda de Porto Alegre, Daniel Rodrigues Figueiredo, explica que nos últimos anos, a recuperação administrativa tem alcançado cerca de 40%, um resultado considerado altamente positivo, sobretudo quando comparado ao retorno judicial, que dificilmente ultrapassa 5%.
“Já temos como medida permanente, fato comprovado pela própria orientação da PGM para que se dê, preferencialmente, prioridade para enviar para execução judicial os créditos já protestados. Convênios mais amplos com os tabelionatos, através da integração de plataformas, poderiam tornar essa prática mais institucionalizada e efetiva”, ressalta o diretor.
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Fonte: Revista Cartórios com Você